segunda-feira, 27 de maio de 2013

Vergonha

Olho no espelho. O que vejo? O rosto de alguém que morre de vergonha. A vergonha está marcada nessa cara, no cabelo desarrumado, na sobrancelha mal feita, nas espinhas que teimam em aparecer. Vergonha total, cheia, gorda, amarga, feia, suja. Vergonha triste, desamparada. Vergonha que não sabe fazer outra coisa que não ficar ali, preenchendo todos os cantos côncavos desse rosto. Vergonha que parece emanar das olheiras fundas. Vergonha que não tem bordas, não tem início, nem meio, nem fim. Essa vergonha apenas é. Não apenas, porque ser nunca é só isso. A vergonha é a imperatriz desse rosto maculado por uma imundície fétida, por toda a podridão que pode haver nos submundos. Corvos e ratazanas perpassam como sombras os olhos desse rosto. São olhos envergonhados que piscam, mas não se esvaem em lágrimas, pois até estas se recusam a percorrer uma face, assim, tão desprezível.

Nenhum comentário:

Postar um comentário