(...) A excessiva compartimentação disciplinar produziu, como contrapartida, um movimento a favor do estudo da totalidade em ciências naturais e humanas. Desde então se restabeleceu a necessidade de alcançar uma cultura geral que permitisse ao estudioso mudar de especialidade no curso de sua vida intelectual. Propôs-se uma solução que continua válida: tornar-se especialista no estudo de um problema, independentemente de qualquer especialização advinda das disciplinas que se ensinam em distintas faculdades.
No campo da cultura geral se restabeleceram perguntas que hoje estão mais vivas que nunca: que cultura geral devemos adquirir e em consideração a que objetivos epistemológicos, estéticos, políticos, históricos devemos forjá-la? Que autores e livros devemos conhecer? Ou que capítulos de um livro? Ou que métodos e técnicas? Ou que linguagens e formas de expressão, de comunicação, de ação? E se não se é especialista em uma disciplina determinada, por exemplo, se não se é matemático, o que se deve estudar das matemáticas? E, para integrar uma cultura geral que permita a uma pessoa se especializar, o que ela deve aprender ou que conhecimento é necessário dominar no próprio idioma, nas matemáticas, no conhecimento histórico, nas ciências naturais e nas tecnologias?
O assunto consiste em determinar o que aprender e o que ensinar e se resolve em grande medida quando se dá prioridade ao aprender que permite aprender e acumular novos conhecimentos e habilidades, que por sua vez permitem a capacitação máxima de alguém como profissional, como trabalhador manual e intelectual, como cidadão e como pessoa.
A expressão “aprender a aprender” não é uma mera frase. Corresponde a uma necessidade cada vez maior de dominar os métodos de aprendizagem num mundo em que o conhecimento se acumula a uma velocidade crescente. Alvin Toffler, em “Power Shift”, calculou que, quando um menino nascido em fins do século XX terminar a escola profissional, deverá adquirir conhecimento acumulado quatro vezes maior. Ainda assim não poderá ficar satisfeito com o que aprendeu, pois, ao completar cinquenta anos, o conhecimento acumulado no mundo será 32 vezes maior que quando nasceu. Esses cálculos são aproximados e pretensiosos; mas dão ideia da ordem de magnitude em que se delineiam os problemas de aprendizagem. Para fazer frente a eles, surgiu o que se chama de "aprendizagem de segundo grau", que consiste em "aprender a aprender". Apareceram também os programas de "educação contínua", que são o esboço de uma educação geral que atualiza os conhecimentos adquiridos na escola, ou de uma educação que atualiza os conhecimentos na própria especialidade, ou daquela que permite adquirir novas especialidades. Mas ainda não se institucionalizaram cursos de pós-graduação sobre cultura geral científica e humanística que ponham em dia especialistas cujo conhecimento de antigos "bacharéis" já é obsoleto. Na maior parte dos sistemas educativos e de pesquisa, a cultura geral continua no nível do bacharelado ou como mera "divulgação". Quanto à difusão da cultura, também não tem sido proposta como atualização informativa e formativa de conhecimentos científicos e humanísticos.
Por outro lado, cada vez mais se vive a necessidade de participar de trabalhos coletivos - trabalhos em equipes multidisciplinares -, isto é, com especialistas que, vindos de distintas disciplinas, devem se aproximar e aprender uma linguagem comum e até se especializar em uma área comum, interdisciplinar. Esta também é outra meta e outra solução: a integração e preparação de grupos multidisciplinares e interdisciplinares. Ambos os tipos de estudos se realizam ao convocar sociólogos, médicos, engenheiros que tenham uma linguagem franca e adquiram hábitos de comunicação real, ou seja, não inibitória, e apta para uma colaboração cada vez mais eficaz no esboço de pesquisas e projetos nos quais as interseções das várias disciplinas sejam analisadas em equipe.
Os obstáculos para conseguir a colaboração entre diferentes especialistas são enormes: os gracejos e gestos desqualificadores, o manejo deliberado de expressões abstrusas que bloqueiam a comunicação, e até a aplicação injustificada da crítica de "sabichões" aos que se interessam em saber algo mais que sua especialidade, raras vezes derivam na necessidade de delinear uma educação científica dos humanistas e uma educação humanista dos cientistas em todos os níveis, incluindo o pós-doutorado ou o trabalho de campo, na "pólis". Comumente as aproximações acabam em frustração e só funcionam como bloqueios e obstáculos ao genuíno diálogo interdisciplinar característico da pesquisa mais necessária e avançada de nosso tempo.
CASANOVA, Pablo González. "As novas ciências e as humanidades: da academia à política". Páginas 20 e 21.
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